Oficialmente, ele
não ocupa nenhum cargo no governo nem faz parte da assessoria pessoal do
presidente Jair Bolsonaro. Tampouco participou da equipe de transição.
Ainda assim, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) assumiu um
protagonismo inusitado na nova administração.

Terceiro dos cinco filhos do presidente e o caçula entre os três que se fizeram na política à sombra do pai, Eduardo, de 34 anos, é o herdeiro que tem se mostrado mais à vontade até agora no governo. Embora reeleito com quase 2 milhões de votos, a maior votação já obtida por um deputado federal, ele parece mais envolvido com o dia a dia do Executivo do que com as questões mais urgentes do Congresso, como as articulações para formação de um bloco de apoio às reformas, em especial a da Previdência, considerada fundamental para o equilíbrio das contas públicas

Como
uma espécie de 23.º ministro, com o cacife reforçado pelos laços
familiares com Bolsonaro, Eduardo circula com desenvoltura nos
corredores do poder, pontifica sobre as diretrizes do governo, faz
contatos internacionais em nome do pai, à margem do Itamaraty, e foi o
único parlamentar a acompanhar o presidente ao Fórum Econômico Mundial,
em Davos, na Suíça. Nos bastidores, ele manobra como qualquer
representante da “velha política”, para emplacar nomes de seu
relacionamento no primeiro e no segundo escalões e interferir na
redistribuição de órgãos entre ministérios.

Ativista inflamado.
Eduardo foi procurado pelo Estado para comentar a questão e outros temas
abordados nesta reportagem, mas não retornou os contatos feitos via
WhatsApp e celular. Seu assessor de imprensa chegou a responder às
mensagens que o jornal lhe enviou, mas não agendou a entrevista. As
informações incluídas aqui foram apuradas com críticos e aliados de
Eduardo, que convivem ou já conviveram com ele, mas preferiram manter o
anonimato.

Considerado
o representante mais ideológico do clã, ele teve participação ativa na
nomeação do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, cuja
indicação foi atribuída ao escritor e pensador Olavo de Carvalho, de
quem é um fiel seguidor e a quem chama de “o maior filósofo brasileiro
vivo”.

Como ativista inflamado contra o que classifica de
“marxismo cultural”, presente, em sua visão, nas universidades, nas
escolas, na mídia e no mundo do entretenimento, ele teria se envolvido
também, segundo quem acompanhou a formação da equipe de Bolsonaro, na
nomeação do ministro Ricardo Vélez Rodriguez, da Educação, outro
integrante do governo indicado por Olavo.

Em sua cota pessoal,
destacam-se as indicações de Filipe G. Martins, assessor de Assuntos
Internacionais da Presidência, que o acompanha há anos, e as da
empresária Letícia Catelani, sua ex-namorada, e do ex-assessor
parlamentar Márcio Coimbra, para diretorias da Agência Brasileira de
Promoção das Exportações (Apex), com salários na faixa de R$ 40 mil.
Antes, com o apoio de Araújo, ele já havia convencido Bolsonaro a manter
a Apex com o Itamaraty, contra a demanda do ministro Paulo Guedes, da
Economia, que queria o órgão sob seu comando.

Convescote

A
relação de Eduardo com a bancada do PSL – que deve chegar a 55
deputados e se igualar à do PT como a maior da Câmara, com a cassação do
mandato de um parlamentar petista – foi marcada até agora mais pelos
“barracos” de que foi protagonista do que pelo empenho em organizar o
trabalho dos correligionários, muitos dos quais são novatos no
Legislativo.

Depois de chamá-los de “favelados” e afirmar que só conseguiram se eleger por causa do pai, Eduardo se envolveu numa discussão acalorada no grupo dos parlamentares do PSL no WhatsApp. No bate-boca, que vazou para a imprensa, ele disse que a deputada Joice Hasselmann, eleita com mais de 1 milhão de votos, é “sonsa” e tem “fama de louca”. “Não admito nem te dou liberdade para falar assim comigo. Ponha-se no seu lugar”, retrucou Joice.

Numa outra frente, ao debochar de um convescote realizado por um grupo de parlamentares do PSL na China, em janeiro, foi confrontado pelo advogado Cléber Teixeira, chefe de gabinete do deputado Alexandre Frota, que participou da farra. “Se ele falar nesse tom no gabinete do Frota, quebro a cara dele”, disse.

O ambiente ficou tão carregada que
Eduardo e seus aliados já discutem a união dos parlamentares do PSL
considerados como “direita puro-sangue” e a possível migração para outra
legenda. Ao mesmo tempo, ele organizou uma peregrinação de um grupo de
deputados do partido para Richmond, na Virgínia, nos Estados Unidos,
onde vive Olavo de Carvalho, para receber uma espécie de “batismo
ideológico”.

Como conta quem convive com o clã, Eduardo não é tão
próximo do pai quanto seu irmão Carlos, o segundo mais velho do trio,
vereador do PSL no Rio de Janeiro e responsável pela bem-sucedida
campanha de Bolsonaro nas redes sociais. Mas também não é tão distante
quanto Flávio, o primogênito, eleito senador pelo Rio também pelo PSL.
Flávio, que já era o mais independente, afastou-se ainda mais do pai e
dos irmãos com a divulgação do chamado Caso Queiroz, no qual um
ex-assessor seu é investigado por movimentações financeiras atípicas em
sua conta bancária.

“Saia justa”

Talvez,
Eduardo também não tenha a mesma influência de Carlos junto ao
presidente, como se diz, e seja o que mais problemas costuma criar para o
pai – ao menos até o surgimento do Caso Queiroz. Por suas declarações
controversas, Eduardo já levou vários pitos de Bolsonaro, nos quais ele
desautorizava o “garoto” em público.

Foi o que aconteceu quando
falou sobre uma possível rejeição da reforma da Previdência pelo
Congresso. Ou quando criou uma “saia justa” para Bolsonaro na campanha,
com a divulgação de um vídeo em que dizia que bastavam “um jipe, um cabo
e um soldado” para fechar o Supremo Tribunal Federal (STF).

Nada
isso, porém, parece abalar a relação de Eduardo com o pai ou
constrangê-lo em seus movimentos. Ao contrário. Na situação de filho do
presidente, referendada por um resultado excepcional nas urnas, Eduardo
parece convencido de que tem a força e está blindado em sua atuação de
ministro sem pasta.

Ambicioso, ele pode estar se preparando para
voos mais altos. Questionado por uma jornalista sobre seu desejo de
suceder o pai em 2022, durante uma viagem ao Chile em dezembro, Eduardo
respondeu: “Não estou trabalhando para daqui a quatro anos ser
presidente do Brasil. Mas, se as coisas correrem naturalmente, por que
não?”.

Contradição entre o discurso e a realidade

O deputado
Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) defende a moralização da administração
pública, mas nem sempre se mostra disposto a abandonar privilégios que,
se não são ilegais, simbolizam o sistema de benesses em vigor no País,
que ele tanto critica.

Embora tenha morado com o pai em seu
primeiro mandato, de 2015 a 2018, Eduardo recebeu auxílio-moradia, de R$
4,3 mil por mês. Além disso, apesar de ter se reeleito e de já ter
moradia na cidade, ele embolsou no final de 2018 R$ 33,7 mil em
auxílio-mudança pago pela Câmara.

Por suas publicações truculentas
nas redes sociais, nas quais tem milhões de seguidores, e por suas
propostas polêmicas, Eduardo já foi chamado de pitbull do clã. Ele
próprio afirma, porém, amparado pelo pai, que o verdadeiro pitbull da
família é seu irmão Carlos, vereador no Rio de Janeiro.

Aqueles
que tiveram ou tem contato com Eduardo dizem que, pessoalmente, ele não
lembra nem de longe o ativista aguerrido que mostra ser em seus
discursos e na internet. É até difícil acreditar, mas, segundo eles,
Eduardo é gentil e não costuma partir para o confronto direto com seus
interlocutores.

Formado em Direito na Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ) em 2008, ele passou num concurso para escrivão da
Polícia Federal e atuou na cidade de Guajará-Mirim, em Rondônia, na
fronteira com a Bolívia, no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, e na
capital paulista, até se eleger deputado pela primeira vez pelo PSC, em
2014.

Semente liberal

Em 2016 e 2017, ele
cursou a pós-graduação em Escola Austríaca, de orientação ultraliberal,
no Instituto Mises Brasil, levado pela empresária Letícia Catelani, que
assumiu em janeiro uma diretoria da Agência Brasileira de Promoção de
Exportações (Apex), por indicação dele.

Provavelmente, foi Eduardo quem plantou a semente do liberalismo em Bolsonaro, abrindo espaço para ele se aliar a Paulo Guedes, hoje ministro da Economia. Mas, apesar de se dizer um defensor do livre mercado, ele segue a máxima do filósofo Olavo de Carvalho de que a questão mais relevante é a cultural e não a econômica.

Surfista do tipo “menino do Rio”, que já pegou onda no Havaí e em Bali, na Indonésia, Eduardo aproveitou a realização da Cúpula Conservadora das Américas, em dezembro, em Foz do Iguaçu, para pedir, de joelhos, diante da plateia, sua noiva, a psicóloga Heloísa Wolf, em casamento.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.