Publicado no dia 20 de maio deste ano, o decreto estadual nº 65.933, que estabelece incentivos fiscais para empresas aéreas que consumirem Querosene de Aviação (QAV) em Alagoas, ainda não surtiu o efeito desejado, segundo números divulgados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Passado mais de um mês da publicação do documento, a única companhia que se utilizou dos benefícios fiscais do governo de Alagoas, que reduziu para até 5% a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), foi a Azul, a terceira menor empresa de voos comerciais a trafegar pelo Estado.

De acordo com os dados da ANP, no primeiro semestre deste ano, a venda de QAV em Alagoas ficaram praticamente estáveis em relação ao mesmo período do ano passado, caindo de 27,81 milhões de litros no ano passado para 27,55 milhões de litros nos seis primeiros meses deste ano – uma retração de 0,9%.

Em junho, o primeiro mês que efetivamente passou a vigorar o decreto governamental regulamentando os incentivos fiscais, a retração nas vendas do combustível atingiu 10,4% – recuando de 4,24 milhões de litros para 3,79 milhões.

Além de incentivar mais voos para o Estado, o gesto do governador Renan Calheiros (MPB) tinha como finalidade atrair mais companhias aéreas para o Estado, aumentando, assim, o número de turistas que visitam as nossas belezas naturais. Até agora, porém, o decreto não passou de mera vontade. Segundo números da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), nos seis primeiros meses deste ano, o número de pousos e decolagens no Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares registraram uma queda de 5%, caindo de 9.039 no primeiro semestre do ano passado, para 8.587 no mesmo período deste ano.

Em junho – um mês e dez dias após o decreto entrar em vigor -, o número de pousos e decolagens no aeroporto alagoano despencou 14.2%, recuando de 1.441 registros para 1.236, segundo os dados da Infraero.

Como resultado, o número de passageiros que passaram pelo aeroporto Zumbi dos Palmares consequentemente despencaram 1,55% nos seis primeiros meses deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado, saindo de 1,071 milhão para 1,055 milhão de pessoas na passagem de um semestre a outro.,

Quando comparados os meses se junho de 2018 e 2019, o número de passagens embarcados e desembarcados no Zumbi dos Palmares recuou 8,9% – saindo de 156,2 mil para 142,3 mil entre um período e outro.

Em julho, quando assinou o termo de concessão de incentivos à companhia aérea Azul Linhas Aéreas, o governador estimava que a companhia ampliasse, como contrapartida, o número de voos para o Estado. “A previsão da empresa é de crescer, no mínimo, 18% em partidas para Maceió no comparativo ao ano passado, no período entre setembro de 2019 a Agosto 2020”, envaideceu-se o governo, na época.

“O que define o percentual de redução [de 12% para 5%] do imposto é a quantidade dos novos voos oferecidos pelas companhias, e o pleito das empresas que solicitam a redução é deliberado pelo Conselho Estadual do Desenvolvimento Econômico e Social (Conedes)”, justificou o governador Renan Filho, por meio de assessoria de imprensa.

O que o governo de Alagoas não contava era com a guerra fiscal que se estabeleceu no País, principalmente no campo da aviação. O decreto publicado por Renan Filho em maio deste ano atende a convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) que permite a redução de ICMS sobre QAV para 13 Estados. Além de Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Sergipe têm direito a redução de alíquota.

O secretário de Estado do Desenvolvimento Econômico e Turismo,
Rafael Brito, chegou a defender a política de renúncia fiscal, classificando como “vanguardista” a redução do ICMS. Em matéria publicada noa jornal Valor Econômico no mesmo dia em que o governo de Alagoas divulgava o decreto, o próprio secretário da Fazenda de Alagoas, George Andre Palermo Santoro, reconhecia que a questão de incentivos fiscais para querosene de aviação era complexa e resultava num redesenho da malha aérea do Brasil, com impactos no turismo e na economia dos Estados.

“O assunto merece tratamento mais equilibrado e estudo mais acurado das repercussões”, disse na época, alfinetando o governo de São Paulo, que anunciou, em fevereiro deste ano, a redução de 25% para 12% do ICMS sobre o combustível de aviação. Paralelamente ao pedido de adesão ao convênio do Confaz, o governo paulista enviou à Assembleia Legislativa um projeto de lei propondo a alíquota menor para o setor, o que acabaria sendo aprovado em junho deste ano.

“A iniciativa integra o Programa São Paulo pra Todos, que busca ampliar a malha aérea no Estado a partir de diversos aeroportos paulistas”, informou o governador João Dória (PSDB), por meio de assessoria. “A contrapartida das companhias aéreas inclui a oferta, em até 180 dias, de 490 novos voos semanais para 21 Estados e 38 aeroportos, além da criação de seis novos destinos dentro de São Paulo, aumentando a oferta de destinos em todo o Brasil”, completou.

Segundo Dória, a desoneração tributária do setor aéreo será compensada pelo impacto econômico gerado pelas contrapartidas. “Com a nova alíquota, a arrecadação prevista para 2019 sobre a comercialização de querosene aéreo cairá de R$ 627 milhões para R$ 422 milhões, mas a compensação total – direta, indireta, induzida e catalisada – representa uma previsão de ao menos R$ 316 milhões”, informou.

Nesta guerra fiscal, Alagoas entra com uma desvantagem desproporcional em relação a estados como São Paulo, por exemplo. Segundos os dados da ANP, o volume de querosene de aviação comercializado naquele estado atingiu 1,56 bilhão de litros no primeiro semestre – um volume 5.598% maior do que o comercializado em Alagoas.

Somente em junho – quando os decretos já estavam valendo em ambos os estados – o volume de querosene de aviação comercializado em São Paulo atingiu 241,1 milhões de litros, contra 3,7 milhões de litros vendidos em Alagoas, uma diferença de 6.416%. É como se, de baixo, Alagoas visse São Paulo alçar voos maiores.

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