O governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) tentará colocar em prática nos próximos dias um plano de remoção gradual da favela do Moinho, considerada a última do centro da capital paulista.
Cenário de incêndios, disputas por posse e alvo de uma recente megaoperação policial contra o tráfico de drogas, a densa ocupação murada cresceu nas últimas três décadas entre duas ferrovias na divisa dos bairros Campos Elíseos e Bom Retiro. Agora, sua retirada divide opiniões.
Silos em ruínas de um moinho de farinha desativado cercados por moradias da comunidade do Moinho, na região central de São Paulo, ao lado do viaduto Eng. Críticos do plano contestam a necessidade da remoção justamente no momento em que moradores conseguiram a instalação de água e saneamento básico. Já o governo afirma ter encontrado uma solução com oferta de moradia digna e acessível capaz de convencer a maior parte dos habitantes a sair.
Favelas surgiram em SP na década de 1930 e se multiplicaram a partir de 1970 Segundo a gestão Tarcísio, 513 das 813 famílias aderiram oficialmente à proposta. Assim, o governo afirma ter condições de transferir todos os residentes para habitações subsidiadas pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano). Esse é o número de famílias que entregaram documentação completa para ingressar no programa, sendo que 444 já teriam o destino definido.
Outras 172 também teriam aceitado a oferta habitacional, mas ainda devem documentos à companhia, segundo o governo.
Parte da comunidade, no entanto, se recusa a sair. Esse grupo diz que a adesão dos moradores ocorre diante do temor de uma retirada à força e sem qualquer compensação.
A regularização fundiária é a principal reivindicação desse grupo, segundo o advogado Vitor Goulart Nery, integrante da área de projetos sociais do Escritório Modelo da PUC, que há cerca de 15 anos representa a comunidade.
Algo que o governo diz ser inviável devido aos riscos relacionados à operação das linhas 7-rubi e 8-diamante da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). “É um risco muito bem mapeado pela Defesa Civil, o que torna inviável qualquer tentativa de regularização”, diz Reinaldo Iapequino, presidente da CDHU.
Quem quer ficar reclama que a maior parte das unidades a serem oferecidas não está pronta, sobretudo no centro, onde a oferta atual é de pouco mais de cem unidades. Outras 400 estão em produção, mas a maior parte -cerca de 560- ainda começará a ser construída e a entrega poderá demorar algo perto de dois anos.
Durante essa espera, as famílias receberão R$ 800 de auxílio aluguel, sendo 50% do valor pago pelo estado e a outra parte pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Antes, haverá o pagamento de R$ 2.400 para cobertura de gastos com a mudança.
O valor pode ser insuficiente para locação de moradia de qualidade, principalmente na região central, o que forçaria mudanças para habitações igualmente precárias, de acordo com Isadora Guerreiro, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
Ao aceitar a proposta, o morador tem as opções de ir para uma das unidades compradas pela CDHU no mercado privado ou de sugerir um imóvel escolhido por ele. O valor máximo financiado para apartamentos na região central é de R$ 250 mil. Se a escolha for para outros bairros ou cidades do estado, o crédito máximo é de R$ 200 mil. A mensalidade do financiamento é de 20% da renda familiar ao longo de 30 anos.
Nascida no Moinho e uma das líderes da comunidade, Yasmin Moja, 24, diz que a espera pela moradia e até mesmo o pagamento são inviáveis para grupos mais vulneráveis. “Reivindicamos a gratuidade”, afirma.
A ocupação tem um contexto complexo até mesmo quando o assunto é o futuro da área, já que a posse é da SPU (Secretaria de Patrimônio da União). Isso obriga a gestão Tarcísio a negociar com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não somente a sua entrada no local, mas também a cessão da área onde o governo paulista planeja construir um parque.
Já a União condiciona sua concordância a um plano que garanta moradia para os removidos. Em nota, a SPU informa que não há previsão para a cessão porque o processo depende de ajustes com a CDHU e que, além disso, aguarda o projeto detalhado do parque.
O governo de Tarcísio avalia como estratégica a desocupação da área para colocar em prática um plano de requalificação urbana da região central, que obrigatoriamente passa pela redução das cenas abertas de consumo de drogas.
Investigações do Ministério Público apontam que traficantes infiltrados no Moinho usam o local para abastecer o fluxo de usuários de drogas da cracolândia.
O argumento é contestado por lideranças comunitárias e grupos contrários à desocupação. Eles acusam o governo de exagerar a responsabilidade da comunidade na cracolândia porque a retirada da favela promoverá valorização imobiliária, corroborando o plano urbanístico que tem como vedete a construção do novo Centro Administrativo do Estado.
Por Folhapress \ NOTÍCIAS AO MINUTO
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