Lora D’Alesio se lembra do momento em que seus lábios começaram a ficar azuis e sua respiração cessou.
“Meu coração tinha parado”, conta a britânica ao programa Victoria Derbyshire, da BBC. “Eu estava sem vida, fiquei morta por cinco minutos. Pelo que sei, os médicos trabalhavam sem parar para me trazer de volta à vida.”
Lora havia sofrido uma parada cardíaca, algo bastante inesperado considerando que ela tinha apenas 24 anos de idade.
Só no Reino Unido, estima-se que 80 mil jovens britânicos tenham problemas cardíacos não diagnosticados, segundo a Fundação do Coração do país. Se não tratados, esses problemas podem ser fatais. No Brasil, segundo o Datasus, 596 pessoas de 20 a 29 anos morreram de infarto agudo do miocárdio em 2016.
No caso de Lora, que trabalha como enfermeira veterinária, o infarto aconteceu três anos atrás. Ela perdeu a consciência ao chegar em casa do trabalho. Ela ainda não sabia, mas tem um problema cárdiaco chamado síndrome do QT longo – um mal hereditário que afeta o ritmo do coração, fazendo com que este leve mais tempo para se recarregar a cada batida.
“Eu disse (à minha colega de casa) que me sentia zonza e, quando ela se virou para mim, eu já estava no chão. Ela achou que eu estava brincando.”
Lora foi salva pela equipe de emergência e levada ao hospital, onde passou três dias em coma.
Quando acordou, chorava sem parar. “Eu estava tão confusa”, lembra. “Você pensa que só as pessoas mais velhas caem mortas por conta de problemas cardíacos, mas não as jovens. Na minha idade, eu pensava, ‘não, de jeito nenhum’. Imagine só, eu tinha só 24 anos.”
Prevenção
O tema ganhou destaque no Reino Unido porque uma nova pesquisa da Fundação do Coração calculou que 83 mil pessoas de 15 a 25 anos podem ser portadoras de um gene defeituoso que as deixa sob um risco alto de desenvolver males cardíacos ou morrer subitamente, ainda na juventude.
Muitas dessas pessoas nunca vão ter qualquer problema no coração, mas, como esse problema é subdiagnosticado, outras possivelmente só descobrirão serem portadoras quando sofrerem uma parada cardíaca.
Elijah Behr, médico-sênior da Universidade de Londres, diz que, embora males cardíacos hereditários sejam raros, “se somarmos todos eles, chegamos a um número significativo (de pacientes)”.
“Tanto que 1.500 jovens morrem anualmente no Reino Unido desses males hereditários. E o desafio é identificar essas pessoas e tentar prevenir essas mortes.”
Behr pesquisa formas de determinar as causas genéticas de paradas cardíacas, na expectativa de avançar na prevenção de mortes súbitas.
Alguns médicos defendem que jovens passem por exames obrigatórios que busquem problemas cardíacos ocultos; outros, porém, acham que antes precisamos de mais pesquisas antes de colocar ideias do tipo em prática.
Jogando futebol
Em 2016, Barry e Gill Wilkinson perderam o filho Dan, de 24 anos, que morreu subitamente durante uma partida de futebol. O garoto levava uma vida saudável e ativa – chegou até mesmo a jogar na equipe juvenil de um time britânico.
“Ele tinha um problema cardíaco sério, mas não havia nada que indicasse a ele, ou a nós, de que havia algo errado”, conta seu pai. “Vinte quatro horas antes (de morrer), ele havia falado conosco pelo Facetime, e estava normal.”
Dan tinha uma cardiomiopatia arritmogênica do ventrículo direito (ARVC), que enfraquece a parede do coração e pode causar uma parada cardíaca. Ele perdeu a consciência enquanto jogava, e seus colegas de equipe telefonaram para Barry. Mas, quando o pai chegou ao local, Dan já estava morto.
“É algo que te deixa em choque”, conta Gill, mãe de Dan.
Barry seca as lágrimas enquanto o casal lembra como queria ter podido dizer ao filho “eu te amo” uma última vez. Hoje, eles comandam uma ONG que distribui desfibriladores para serem usados em campos de futebol amador. Um deles chegou a ser usado para salvar a vida de um menino de 14 anos que teve uma parada cardíaca enquanto jogava.
‘Sorte de estar viva’
A jovem sobrevivente Lora D’Alesio agora dedica parte de seu tempo a compartilhar sua história.
“Quero muito que os jovens tenham consciência de que isso pode acontecer com eles. Doenças cardíacas não discriminam ninguém”, diz.
Ela hoje tem um marcapasso e carrega um desfibrilador, que eventualmente pode ser usado para salvar sua vida. Mas, por enquanto, ela diz tentar aproveitar cada dia.
“Aceito os convites mais aleatórios que meus amigos fazem, porque nunca se sabe quando (uma parada cardíaca) pode acontecer novamente e me matar. Quero viver a vida ao máximo. Tenho sorte de estar viva.”
TERRA.COM