Em uma das raras vezes em que falou com jornalistas durante seu mandato à frente da Procuradoria-Geral da República, Raquel Dodge disse estar preocupada com a democracia e, emocionada, destacou que procurou trabalhar em “áreas mais nodais” em busca de uma sociedade mais igualitária e justa.
O mandato de Dodge como procuradora-geral termina na próxima terça-feira (17). Nesta quinta (12), ela participou de sua última sessão plenária no Supremo Tribunal Federal. Ao final, respondeu a perguntas dos jornalistas.
“Acho que a democracia é uma obra coletiva, da sociedade, das instituições. Na minha mensagem final aqui no Supremo procurei enfatizar que nós levamos 30 anos para erguer a democracia do Brasil e fizemos isso numa onda internacional de criação das democracias liberais em vários países”, disse Dodge.
“Acho que o grande desafio do século 21 é não deixar que as democracias morram. Muitas vezes acontecem avanços e também retrocessos, e eu percebo com alguma preocupação muitos sinais de retrocesso no tocante às democracias liberais no mundo. Eu espero que isso não aconteça no Brasil.”
Para Dodge, a sociedade está atenta, cobrando resultados das instituições. Retomando o discurso que fez quando assumiu o cargo, em setembro de 2017, ela defendeu a melhoria da educação e dos serviços públicos em geral, com destaque para a segurança pública, e disse que é preciso dar condições para os jovens das periferias.
Eu me empenhei muito para trabalhar nessas áreas mais nodais, achando que, fazendo assim, a gente conseguiria fortalecer essa promessa de sociedade que está na nossa Constituição”, afirmou, sem conter as lágrimas.
Questionada sobre as críticas que recebeu dentro e fora do Ministério Público Federal por, supostamente, ter diminuído o ritmo da Lava Jato, Dodge disse que seu legado nessa seara ainda vai aparecer.
“A maior parte das peças que ajuizei no Supremo estão em segredo de Justiça e no tempo próprio elas expressarão o empenho com que eu trabalhei no enfrentamento da corrupção naquilo que me cabe aqui”, respondeu.
“No tocante à atuação dos meus colegas, tenho certeza de que dei a eles toda a estrutura necessária para o enfrentamento à corrupção, dotando não só cada Procuradoria com a verba necessária como também apoiando todas as iniciativas que eles tiveram”, disse.
Segundo Dodge, sua gestão ampliou o número de procuradores em todas as forças-tarefa da Lava Jato, no Paraná, em São Paulo e no Rio de Janeiro.
“Deferi a remessa de todas as verbas necessárias. Além disso, em relação a todos os recursos que chegaram para minha atuação, empenhei-me também muito pessoalmente em sustentar todas as teses necessárias para enfrentamento da corrupção, do crime organizado e da lavagem de dinheiro.”
Indagada sobre alguma frustração que tenha tido nesses dois anos no cargo, Dodge afirmou que é otimista, que trabalhou com zelo e empenho e atingiu muitas das metas que estabeleceu, “todas voltadas para o fortalecimento da democracia brasileira, da defesa de direitos fundamentais e da atuação do Ministério Público”. Ela disse que pretende fazer uma transição tranquila na instituição.
O indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para substituí-la é Augusto Aras, que deverá ser sabatinado pelo Senado no próximo dia 25. Aras foi escolhido sem participar da eleição interna no MPF. Foi a primeira vez, em 16 anos, que um presidente da República ignorou a lista tríplice feita pela categoria.
Seguir a lista não é uma imposição legal, mas havia se tornado uma tradição no Ministério Público Federal.
(FOLHAPRESS)