É tradição. As feiras dos movimentos da reforma agrária tem calendário fixo e pelo menos cinco vezes por ano movimentam a Praça da Faculdade, em Maceió. Desta vez, o Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST) é quem está promovendo. Desde ontem (4) até a manhã do próximo sábado, a população de Maceió pode comprar alimentos frescos e livres de agrotóxicos, e aproveitar atrações culturais todas as noites.

São 100 mil toneladas de alimentos, 100 feirantes vindos de Olho D’Água do Casado, Água Branca, Teotônio Vilela, Delmiro Gouveia, Maragogi, Japaratinga, Porto Calvo, Murici, Branquinha, Messias, São Luis do Quitunde, Flexeiras e União dos Palmares. Além dos agricultores do MLST, tem feirantes da Comissão Pastoral da Terra, Movimento Sem Terra e Via do Trabalho. Segundo a organização, “É uma oportunidade de estar se relacionando e fazer a troca de produtos e sementes entre agricultores”.
Diana Aleixo, coordenadora do MLST, explica que esse ano estão indo além do combate ao agrotóxico. “Defendemos o fim do agrotóxico, e trazemos produtos limpos, mas além disso estamos agora focando em promover a agroecologia, que é o cuidado com a terra, outro processo de produção”, conta ela.

Segundo Diana, técnicos estão conversando com feirantes e até antes da feira eles tem realizado encontros sobre isso. “O agricultor hoje ainda está condicionado à cultura da produção de longa escala. Plantar pomar 50 mil pés de abacaxi. Esse manejo agroecológico preza pela diversidade. Abacaxi, batata, inhame, banana, tudo em um só espaço. Chamamos de mistura da sobrevivência. Porque essa monocultura que a gente vem aprendendo há muito tempo agride a natureza, é desgastante pra a terra a água e os minérios”.

Além das feiras maiores, que acontecem na Praça da Faculdade, os movimentos realizam eventos menores nos municípios, para chamar atenção da comunidade para a produção nos municípios.

A feira tem mudado a vida das pessoas. Ivete romeiro, de Joaquim Gomes, participa há 10 anos. Emocionada, ela conta que antes seu marido precisava viajar por meses para o Mato Grosso para garantir o sustento da família, mas isso mudou quando começo a entrar dinheiro com as vendas. “Eu disse a ele, você não vai viajar mais. Ele fica plantando, e eu saio toda semana. Vendo no Eustáquio Gomes e no São Jorge. Pra tirar o sustento é bom demais!”. O grupo que monta essas feiras nos bairros é composto por quatro mulheres. “Nos chamam de mulheres guerreiras, porque a gente que faz tudo, até descarregar o carro. E quando a gente vem pra cá o pessoal de lá reclama, diz que a gente abandonou”.

A receptividade do público não poderia ser melhor. Antes mesmo de começar a feira a procura é grande, muitos produtos foram vendidos ainda durante a montagem das barracas. “No primeiro dia teve um fluxo de mais de mil pessoas, e não tínhamos nem energia ainda”, fala Diana. A coordenadora explica que como no local da feira tem pontos de transportes de outros municípios, é comum pessoas de municípios vizinhos como Marechal Deodoro e Coqueiro Seco se organizarem para vir fazer grandes compras.

Integração campo e cidade nos espaços públicos

Com o objetivo de levar de volta a comunidade para os espaços públicos com lazer e fortalecimento da cultura, a feira sempre traz uma ampla programação cultural nas noites. Desta vez, tem artistas alagoanos e pernambucanos entre as atrações. Rogério Nicácio, Samba da Periferia, Kleber Canto e Banda LaBiata, Wagner Wolpone, Guila Gomes e Os Caetanos. Entre as apresentações da sexta à noite, será realizado o tradicional bingo do carneiro.

Integrados com os ambulantes que estão sempre na praça, os participantes da feira defendem uma harmonia entre campo e cidade. Tem parque de diversões, lanches e outras coisas que já fazem parte da praça e se misturam com a programação da feira. Movimentada das 6 da manhã até as 2 hs da madrugada do outro dia, a Praça se torna um ambiente mais seguro para todos.

O público é só elogios. Maria José Lira viu na TV e foi conferir pela primeira vez. “Acabei de chegar e estou adorando”, disse ela com um biscoito na mão e uma sacola cheia de compras. Maria Lúcia mora perto da Praça. Ela vem durante o dia comprar há anos, e diz que sua filha sempre prestigia a programação cultural.

Ulisses Pantaleão sai do tabuleiro do Martins só pra comprar. “Toda vez que tem, sempre venho. Porque é um produto bom, que não tem agrotóxico, é saudável. Se não tem outro jeito compro no mercado, mas aqui é completamente diferente, outro sabor”. Ele compra de tudo, melancia, banana, abacaxi, bolos… Garante que a família gosta.

Segundo a organização, tem gente que compra no primeiro dia e acaba voltando no último, porque percebe que o sabor é diferente. O preço é outro atrativo que eles encontram. “O preço é a critério dos feirantes, mas gente constata que o preço deles é diferenciado de acordo com o mercado local”, afirma Diana.
A diversidade encontrada é grande. Tem produtos in natura como frutas, legumes e raízes, mas também tem preparados prontos para o consumo, como bolos de massa puba, tapioca, bolo de milho e caldo de cana. Uma casa de farinha garante o produto quentinho, feito na hora. E pra quem tem mais disposição, até animais vivos como cabritos e galinhas são comercializados no local.

Santana do Mudaú: Iteral fortalece agricultura familiar

O município de Santana do Mundaú conhecido como “Terra da laranja lima” vem sofrendo com a praga da “mosca negra” (Aleurocanthus woglum), que tem causado prejuízos irreversíveis aos laranjais. Porém, nesse ano, os produtores rurais foram incentivados a buscar alternativas sustentáveis para conter os danos e diversificar a produção agrícola, e o exemplo tem sido demonstrado pelos quilombolas da região.

O Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral) tem sido um apoiador efetivo das três comunidades remanescentes de quilombo existentes – Jussara, Mariana e Filús – que juntas reúnem cerca de 120 famílias no município. A assessoria técnica dos núcleos quilombolas e indígenas do Iteral em conjunto com técnicos da Emater fizeram várias visitas às comunidades com o intuito de orientar sobre os cuidados para conter o desgaste do solo e fortalecer os quintais produtivos com a inserção de outras culturas, a exemplo do abacaxi, maracujá e as hortas agroecológicas, inclusive, mobilizou o apoio de assentamentos rurais para a doação de mudas.

“Com a realização de duas edições da Feira Agrária do Crédito Fundiário e Quilombola no município em parceria com a prefeitura, contribuímos para a geração de renda e incentivamos o escoamento da produção agrícola, mostrando que é possível investir na agricultura familiar. Os quilombolas deixaram de usar os produtos apenas para consumo próprio, e também, passaram a fornecer para a merenda escolar e participar de feiras em outros municípios”, destacou Leone Silva, assessora técnica e coordenadora das feiras promovidas pelo Iteral.

A iniciativa também motivou o Instituto Irmãos Quilombolas a concorrer ao edital de credenciamento nº01/2019 promovido pela Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Aquicultura (Seagri), e no primeiro semestre foi um dos selecionados com a doação de 10 barracas para feiras. No último dia 19 de novembro de 2019, a instituição lançou oficialmente o projeto denominado Quarta Verde com a efetivação de uma feira livre para a comercialização exclusiva dos quilombolas; e os próximos passos é a implantação de um galinheiro, fábrica de bolos e polpas de frutas.

“A gente vivia da safra da laranja, mas eu sempre quis ter a minha horta, e agora estou realizando esse sonho! São produtos sem veneno, é tudo orgânico, eu planto couve, coentro, cebolinha, alface, pimentão, tomate e abóbora. A importância dessa feira é para mostrar pra todo mundo o que a gente tem no quilombo e vender nossos produtos”, declarou a quilombola Raimunda Caetano da Silva.

De acordo com o prefeito Arthur Freitas as parcerias são essenciais para garantir o desenvolvimento rural. “Esse projeto é muito importante para a nossa região, que é essencialmente agrícola e possui vários pequenos produtores. O Iteral é um grande parceiro do município há anos e o apoio nesse projeto só tem a fortalecer as comunidades quilombolas e a comercialização movimentará a economia, o nosso objetivo é sempre buscar alternativas novas para fortalecer a agricultura familiar do nosso município”.

O projeto Quarta Verde acontece todas às quartas-feiras na praça do povoado Mundaú de Baixo das 13h às 17h; e nas sextas-feiras das 6h às 17h no Residencial Jussara. A população de Santana de Mundaú pode comprar produtos de qualidade como: hortaliças, frutas, doces caseiros, bolos, pé de moleque, beiju, artesanato, dentre outros.

TRIBUNA HOJE