Os frigoríficos possuem especificidades que os tornam ambientes propícios para a transmissão de covid-19, afirmam especialistas. Segundo o infectologista Estêvão Urbano, diretor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), o ambiente refrigerado e com pouca ventilação pode favorecer a transmissão, mas não há relação com o contato com animais mortos.

Dados do Ministério Público do Trabalho mostram que 25% dos casos de covid-19 no Rio Grande do Sul se referem a trabalhadores de frigoríficos. O Estado acompanha 21 surtos em frigoríficos e laticínios, segundo dados do último boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul.

Urbano explica que as baixas temperaturas e a refrigeração ressecam as vias áreas. “Com as vias áreas mais ressecadas, os vírus respiratórios possuem maior facilidade de contaminar, isso diminui as defesas orgânicas das pessoas. Já a baixa ventilação contribui para que o vírus não se dissipe, isso, somado à aglomeração de pessoas, favorece muito a transmissão”, afirma.

Segundo o Ministério da Agricultura, a China suspendeu importações de três processadores de carnes brasileiras. Não foram apresentadas justificativas formais, mas o órgão responsável pela área na China solicitou informações sobre estabelecimentos de exportação do Brasil que tiveram surtos de coronavírus.

Segundo o infectologista Carlos Lazar, professor da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), não existe nenhuma comprovação de que a carne possa transmitir o coronavírus, porém a possibilidade existe. “Começou em um mercado de animais, que estavam mortos, não se sabe se o vírus continua ativo se estiver na carne. Com o tempo da exportação muito provavelmente não, mas essa ação demonstra que a China tem esse medo.”

Surtos também ocorreram em frigoríficos norte-americanos. Desde o início da pandemia, mais de 30 mil trabalhadores de frigorífico tiveram testes positivos para a covid-19 e pelo menos 113 morreram, de acordo com uma contagem da Food and Environment Reporting Network.

Lazar explica que o trabalho “ombro a ombro” realizado em frigoríficos é a principal especificidade que contribui para maior transmissão. “Esses trabalhadores teriam que ficar a pelo menos 2 metros de distância um do outro. Se você fala e respira do lado do seu colega, pode contaminá-lo, mesmo com uso de máscara.”

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Além disso, ele explica que seria importante utilizar o equipamento de segurança individual completo, como avental, proteção para os sapatos, máscara e luvas e fazer a desinfecção de todas as roupas utilizadas no trabalho diariamente. “Os utensílios que são manuseados e os ambientes têm que ser higienizados várias vezes durante o dia”, explica.

“O ideal mesmo seria testar semanalmente esses funcionários, mas isso é inviável financeiramente”, diz o professor, ressaltando que a medição de temperatura só funciona se a pessoa infectada estiver com febre, o que não funciona para os casos de assintomáticos.

Ele enfatiza a importância da fiscalização para que os funcionários realmente utilizem o equipamento completo e o reforço de campanhas que eduquem as pessoas sobre a importância de seguir as medidas de prevenção.

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A ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) divulgou em 15 de maio recomendações sobre o uso de máscaras e ações preventivas de contingenciamento e, no dia 28 do mesmo mês, divulgou uma guia de orientações e boas práticas nos frigoríficos. Em 30 de maio, divulgou novas recomendações de ações preventivas de contingenciamento.

O médico explica que, assim que se é identificado o início de um surto, é necessário afastar todas as pessoas com sintomas e, se possível, fechar a ala. “Se não for possível fechar o setor, aí sim, teria que testar todos os funcionários daquela área e afastar mesmo os assintomáticos.”

*Estagiária do R7 sob supervisão de Deborah Giannini

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