O uso prolongado de melatonina foi associado a um risco maior de insuficiência cardíaca, hospitalização e morte em pessoas com insônia crônica, segundo estudo preliminar apresentado nesta segunda-feira (3) no congresso anual da American Heart Association.

A melatonina é um hormônio produzido naturalmente pela glândula pineal que sinaliza ao corpo o período escuro do dia, iniciando o processo que promove o sono. Suplementos — versões sintéticas idênticas ao hormônio — são frequentemente usados para tratar insônia, caracterizada pela dificuldade de adormecer ou permanecer dormindo.

Esses suplementos podem ser comprados sem receita médica em diversos países, incluindo o Brasil e os Estados Unidos. Os novos resultados, porém, levantam preocupações quanto à segurança do uso prolongado da substância para o coração.

“Os suplementos de melatonina podem não ser tão inofensivos quanto se pensa. Se nosso estudo for confirmado, isso poderá mudar a forma como os médicos orientam seus pacientes sobre indutores do sono”, afirmou Ekenedilichukwu Nnadi, autor principal da pesquisa.

Os cientistas utilizaram o banco de dados internacional TriNetX, com informações de 130.828 adultos com insônia crônica. Eles foram divididos em dois grupos: um formado por pessoas que usaram melatonina por um ano ou mais e outro por indivíduos que nunca tiveram o registro do uso em seus prontuários. Pacientes com diagnóstico prévio de insuficiência cardíaca ou em uso de outros remédios para dormir foram excluídos.

Os resultados mostraram que pessoas que usaram melatonina por longo prazo tiveram uma probabilidade 90% maior de desenvolver insuficiência cardíaca em cinco anos (4,6% contra 2,7% no grupo controle). Em países onde o suplemento exige prescrição, o risco foi 82% maior entre quem teve ao menos duas receitas com intervalo de 90 dias.

O estudo também apontou que usuários de melatonina apresentaram três vezes mais chances de hospitalização por insuficiência cardíaca (19% contra 6,6%) e quase o dobro de risco de morte por qualquer causa (7,8% contra 4,3%) durante o período analisado.

Apesar da associação, os autores ressaltam que não há comprovação de relação direta entre o uso prolongado da melatonina e os riscos cardiovasculares. “São necessárias mais pesquisas que testem a segurança da melatonina para o coração”, disse Nnadi.

Entre as limitações, os pesquisadores destacam que o banco de dados inclui países com e sem exigência de prescrição. Como o uso sem receita pode não ter sido registrado, parte dos usuários pode ter sido classificada incorretamente, distorcendo os resultados.

Para Nnadi, o estudo não indica que a melatonina seja nociva, mas alerta para o uso indiscriminado. “Não devemos presumir que algo é seguro apenas por ser natural ou vendido sem prescrição médica.”

É seguro tomar melatonina?

Segundo Lucio Huebra, neurologista da Academia Brasileira do Sono, a melatonina costuma ser bem tolerada, com baixa toxicidade e sem evidências de dependência, tolerância ou abstinência. Os efeitos adversos mais comuns incluem sonolência matinal, tontura, dor de cabeça, náusea e alteração do ritmo circadiano — especialmente quando ingerida em horários inadequados.

Huebra ressalta que o uso não é indicado para todos, já que a maioria das pessoas tem produção natural saudável do hormônio. A melatonina é recomendada apenas para casos específicos, como distúrbios do ritmo circadiano (como atraso de fase do sono), tratamento de jet lag, irregularidades do sono em pessoas cegas e controle de parassonias, como o transtorno comportamental do sono REM.

Mesmo assim, ela não é considerada tratamento inicial para a insônia crônica no Brasil. A Academia Brasileira do Sono recomenda priorizar medidas comportamentais, como higiene do sono e terapias psicológicas. Quando necessário, o uso de indutores do sono deve ser feito por períodos curtos e na menor dose possível, segundo o especialista.

Por Folhapress \ NOTÍCIAS AO MINUTO

FOTO: © iStock \ Lifestyle MELATONINA-SAÚDE