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A endometriose, que afeta 15% das mulheres em idade reprodutiva no Brasil, é uma doença sem causa definida. Por enquanto, são conhecidos apenas alguns fatores envolvidos, como genéticos e imunológicos, e as consequências, como a dificuldade de engravidar.

Recentemente, um estudo publicado na revista Scientific Reports abriu uma nova possibilidade para as causas da enfermidade: o desequilíbrio bacteriano. Apesar de avançar um pouco na discussão, especialista ouvido pelo E+ afirma que é preciso ter cautela e ainda não há uma relação concreta de causa e efeito.

O estudo foi conduzido na Faculdade de Medicina de Koc, na Turquia, e contou com a participação de 14 mulheres com endometriose de moderada a severa e 14 mulheres saudáveis. Os pesquisadores avaliaram a flora bacteriana vaginal, cervical (colo do útero) e intestinal de todas elas.

No geral, os resultados apontaram que a composição das microbiotas foi similar nos dois grupos. Porém, houve diferenças entre os tipos de bactérias, sendo que a ausência e o aumento de determinadas espécies foram associados às mulheres com endometriose. Os pesquisadores reconhecem que mais estudos são necessários para analisar uma associação entre a doença e a microbiota da mulher.

“Esse estudo levanta mais uma hipótese para entender a causa [da endometriose], porém é baseado em um número muito pequeno de pacientes”, avalia Georges Fassolas, especialista em reprodução humana assistida. O médico considera três interpretações para os resultados do estudo: “pode ser apenas uma coincidência, porque são poucas pacientes; pode realmente ser uma das causas e pode ser a relação com o sistema imunológico”.

Segundo Fassolas, a endometriose leva a um desequilíbrio do sistema de proteção do organismo, o que favorece uma desordem na flora bacteriana do corpo. “Porém, mais do que causa, acredito que o desequilíbrio bacteriano é consequência da endometriose”, afirma.

O que é endometriose?

Endometriose é uma inflamação do tecido interno do útero, chamado endométrio. O crescimento exagerado dessa camada faz com que ela vá para lugares fora do órgão. Porém, Ana Carolina Lúcio Pereira, membro da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), afirma que, mesmo que a implantação atinja níveis externos, algumas mulheres podem não desenvolver a doença. “Não há uma causa definida para a endometriose. Existem vários fatores envolvidos, como genéticos e imunológicos, mas são fatores ainda não conhecidos”, diz a médica.

Os sintomas da endometriose incluem cólicas fortes e recorrentes de difícil controle, que não melhoram com remédios comumente usados, dor forte durante a relação sexual e, em alguns casos, fora do período menstrual. Caso a inflamação chegue ao intestino ou à bexiga, pode haver sangramento, que será visível nas fezes ou na urina.

Bactérias no útero e dificuldade para engravidar

Enquanto mais estudos não comprovam a relação entre bactérias e endometriose, uma coisa é certa: algumas delas presentes no útero favorecem a implantação do embrião no endométrio e outras agem de forma contrária. A quantidade delas também importa, e isso explicaria alguns casos de dificuldade para engravidar.

Esse desequilíbrio na flora bacteriana do útero é chamado de endometrite crônica, que é uma inflamação do endométrio. O problema é diferente da endometriose, que caracteriza-se pela presença de endométrio em áreas externas ao útero. “Na maioria das vezes, não há sintomas, a mulher não sabe o que está acontecendo, mas isso pode provocar falha de implantação [do embrião]”, diz Fassolas, que também é diretor médico da Clínica Vivitá.

A boa notícia é que a endometrite crônica não traz outras consequências para a saúde da mulher. Exames que avaliam a microbiota uterina são indicados apenas quando sabe-se que houve falha na implantação do embrião no endométrio.

Por meio da Análise de Infecção por Endometrite Crônica (ALICE), é possível verificar a quantidade de bactérias presentes no útero. “Se tiver, por exemplo, mais que 95% de lactobacilos, isso favorece implantação. Se tiver menos, seria indicado repor os lactobacilos”, explica o especialista em reprodução humana. A reposição é feita com cápsulas, usadas entre sete e dez dias, que contêm um número certo de lactobacilos, dependendo do resultado do teste.

Já Análise Metagenômica do Microbioma Endometrial (EMMA) identifica, além da quantidade, quais bactérias atrapalham a implantação do embrião. “Se houver uma ou mais que podem atrapalhar, faz-se uso de antibiótico antes de a mulher engravidar”, afirma o médico.

A avaliação dessas bactérias só é possível por meio desses dois testes, ou seja, não há como identificá-las nos exames ginecológicos de rotina. Uma vez que o sistema imunológico está associado a possíveis desordens na flora bacteriana do organismo, o especialista indica manter uma vida saudável para evitar a endometrite crônica.

Estadão
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