Tratar de um câncer não é apenas fazer quimioterapia, radioterapia e, eventualmente, uma cirurgia para retirada do tumor. É preciso cuidar também da mente, do emocional, se sentir acolhido e ter o suporte necessário em tudo o mais que envolve esse processo. Em São Paulo, a Casa Hope é a instituição que cumpre esse papel de forma carinhosa, algo que é manifestado pelas crianças, adolescentes e familiares que passam pelo local.

Nesta sexta-feira, 15, é celebrado o Dia Internacional de Luta Contra o Câncer na Infância e os serviços oferecidos pela instituição têm muito a ver com a melhora dos pequenos no tratamento.

Localizada no Planalto Paulista, zona sul da cidade de
São Paulo, a Casa Hope disponibiliza 192 vagas para pacientes e
acompanhantes que chegam de todo o Brasil para tratar a doença. Além da
hospedagem, eles dispõem de alimentação, medicamentos, terapia
ocupacional, psicologia, escola paras as crianças e cursos
profissionalizantes para o familiar.

“Quando vim para São Paulo, não tinha certeza se iam
salvar minha perna, eu estava desanimado. No primeiro dia [na Casa
Hope], já fiz amigos, tinha muita coisa para aprender”, diz André, de 13
anos, que foi diagnosticado com osteossarcoma no fêmur em 2017. Em
outubro daquele ano, ele e a mãe chegaram à ONG para iniciar o
tratamento dele.

“Foi difícil passar por essa nova fase”, diz Fabiana
Chaves, mãe do menino. “Viemos muito deprimidos, mas foi quando recebi o
maior apoio da Casa, psicologicamente, apoio em relação ao André,
quando tem passeio eles colocam ele junto para se animar. Foi melhorando
o ânimo dos dois e só vinham boas notícias em relação à doença”, conta
ela, que veio de Manaus com o filho.

Infelizmente, o menino teve a perna amputada devido ao
tumor, mas isso não é mais motivo para ele ficar desanimado. “Eu posso
ter uma perna a menos, mas é a mesma coisa. Muitas vezes eu queria
morrer, mas aqui percebi que sou importante para várias pessoas.”

André é uma das oito mil pessoas que passaram pela Casa
Hope em quase 23 anos de atuação. Tudo começou com a atual presidente
Claudia Bonfiglioli, que foi voluntária no Hospital do Câncer e percebeu
a dificuldade das famílias em vir para São Paulo e não ter onde morar.
“Ela uniu alguns amigos, alugou uma casa grande na Vila Mariana, adaptou
e começamos uma unidade”, conta Izilda Moribe, diretora técnica da ONG,
‘braço direito’ de Claudia e que está com ela desde a primeira criança
acolhida.

Naquela época, em 1996, a organização tinha um total de
34 leitos para pacientes e acompanhante. Desde então, a equipe fica em
contato direto com o serviço social de hospitais para viabilizar uma
vaga. A pedido do Hospital das Clínicas, começaram a atender
transplantados de medula óssea, fígado e rim, o que deu origem a uma
nova unidade, também na Vila Mariana.

Hoje, todo o atendimento da Casa está concentrado na
unidade atual, cujo custo mensal é de quase R$ 560 mil. Desde o início
até agora, a ONG conta com a colaboração de parceiros para todas as
atividades realizadas no local, bem como de patrocínios que mantêm, por
exemplo, o funcionamento da escola. Esta, porém, teve de fechar dois
ciclos escolares.

Escola da Casa Hope

Izilda relata que a educação infantil está funcionando
com recursos próprios da instituição, o fundamental I por meio de um
processo de apoio. Já o fundamental II e o ensino médio estão fechados.
“Há três anos fechamos porque, com a crise, o patrocinador teve de
cortar esse recurso”.

“A escola é um dos projetos de maior importância aqui. É
muito difícil aceitar que os adolescentes fiquem sem ela. Agora,
estamos com dificuldade de manter a educação infantil, que vai desde a
brinquedoteca para bebês até alfabetização”, diz a diretora técnica.

Os alunos também lamentam a falta de estudo. “A escola é
muito importante, aprender algo para ter futuro. Creio que vai ter e
vou continuar estudando aqui”, diz André. Fabiana, mãe dele, explica que
quando o garoto foi para o sexto ano do ensino fundamental não havia
ciclo na Casa Hope e ele teve de estudar no hospital.

Atualmente, ele estuda em Manaus e mãe e filho viajam
para São Paulo a cada dois meses porque depois do tumor no fêmur, André
apresentou metástase no pulmão. A preocupação de Fabiana é que ele fique
atrasado na escola.

Jessica Laura, hoje com oito anos, ainda está sendo beneficiada com a educação infantil na casa. A mãe dela, Alcione Maria dos Santos, veio com a menina e o marido de Pernambuco quando a pequena precisou de um transplante de fígado. O pai foi o doador. “Fiquei desesperada porque nunca tinha vindo para São Paulo. Quando chegamos na Casa Hope, em agosto de 2011, fomos muito bem acolhidos. Assim que pisei na casa, todo o medo passou”, conta Alcione. “Aqui encontrei forças para cuidar da minha filha bem tranquila.”

Cinco anos depois do transplante, Jessica foi
diagnosticada com um tumor no abdome. “Foi outra fase difícil, porque
foi no ano em que ela começou a estudar e teve de parar por conta do
tratamento. Vim com essa preocupação, mas chegando aqui ela teve todo o
acompanhamento pedagógico”, diz Alcione.

Após passar por todos os tratamentos, a menina só faz
exames de rotina e vai ficar em São Paulo até o fim de fevereiro. A mãe
conta que ela vai para a escola todos os dias e, assim que volta do
hospital, corre para a brinquedoteca. “Quando chega na casa, ela fica
mais animada.”

“No nosso entendimento, não é só dar suporte para o
momento da doença, mas pensar no futuro, que elas têm que seguir a vida e
isso é muito importante no processo de cura delas. Trabalhamos todos os
setores, emocional, social, e isso elas levam para a vida”, afirma a
diretora Izilda. Prova do benefício desse acolhimento para o tratamento é
André, que tinha três tumores no pulmão por causa da metástase e agora
tem apenas um que não está aumentando. “Como dizem no hospital, pessoa
desanimada faz o câncer piorar, tem que ter autoestima como eu tenho
hoje”, diz o menino.

Apoio aos familiares

O suporte não é apenas subjetivo, é concreto. Dentro da
Casa Hope, as pessoas que acompanham os pacientes têm à disposição
cursos profissionalizantes. A mãe de André tem dois certificados de um
curso de bijuteria e começou o de design de sobrancelhas. Há ainda
cursos de informática básica, moda, gastronomia, manicure. Segundo
Izilda, os serviços permitem que as pessoas voltem para seus locais de
origem e tenham condições de trabalhar.

“Elas [as pessoas] chegam muito vulnerabilizadas, tanto
paciente como o familiar. Com todo o trabalho feito, elas vão ganhando
confiança, se sentem mais amparadas e fortalecidas para continuar com o
tratamento”, diz a diretora técnica.

Doações

A Casa Hope atende pessoas com câncer de zero a 18 anos
de idade. Há aqueles que chegam, saem após o tratamento e precisam
voltar. No caso dos transplantados, são acolhidos pacientes de todas as
idades. Com disposição de veículos 24 horas por dia, ambulâncias,
escola, brinquedoteca e demais espaços, a instituição aceita doações
financeiras e de materiais comumente usados numa casa.

Brinquedos, roupas, móveis são bem-vindos e a ONG pode
enviar uma caminhão para buscar os materiais. Para doar, basta entrar em
contato com a organização por meio do site (hope.org.br), do e-mail (faleconosco@hope.org.br) ou do telefone (11) 5056-9700, ramal 778.

Estadão

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