Perto das festividades de fim de ano, algumas prefeituras de Alagoas já estão encaminhando as mudanças referentes ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) para adequar-se à Emenda Constitucional 103 (EC), a reforma da previdência do governo Bolsonaro, aprovada pelo Congresso Nacional em setembro e sancionada em novembro. O presente de Natal para o servidor público municipal poderá ser o aumento da alíquota de desconto do INSS, que passará de 11 para 14% nos seus vencimentos.

Com aumento de alíquota de desconto, que agora pode chegar a 14% dos vencimentos dos servidores municipais, com a reforma é possível descontar de servidores inativos, desde que estes recebam mais de um salário mínimo, sendo que o percentual de desconto será incidente sobre este acréscimo no salário. A medida mesmo que aprovada ainda este ano, tem uma período de noventa dias de carência, passando a ser efetivada a partir de abril de 2020.

Na perspectiva de eleições municipais e também mudanças nas gestões das prefeituras é que a reforma da previdência nos municípios se insere, trazendo maiores encargos para servidores tanto da ativa quanto aposentados. A Tribuna procurou a Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), os assessores que ajudam na administração dos RPPS, entidades de classe e especialistas na área do direito para esclarecer estas mudanças.

CRÍTICA À ALÍQUOTA

Para Othoniel Pinheiro, defensor-público e doutor em direito constitucional, o aumento da alíquota para os servidores públicos, tanto estaduais como municipais tem questionamentos.

“A reforma que tramitou e foi aprovada no Congresso Nacional aprovou o aumento da alíquota e este aumento, porém está condicionado à comprovação de déficit atuarial a ser equacionado. Ou seja, o município pode aumentar a alíquota se houver déficit na previdência própria. Este deve ser o primeiro questionamento”.

O defensor-público alerta que, “os servidores públicos aposentados que recebem abaixo de R$ 5.800 também terão de contribuir com a previdência social e entrarão na alíquota de 14%. Agora, está autorizado aos estados e municípios cobrar a alíquota para os servidores que ganham a partir de um salário mínimo. O aposentado que recebe um salário mínimo fica isento da contribuição”.

Segundo Othoniel Pinheiro, a reforma trará uma desigualdade entre os regimes de previdência dos funcionários públicos (estatutários) e empregados privados (celetistas). “A regra de cobrança do aposentado que recebe acima de um salário mínimo é apenas para o funcionário público. O funcionário privado se aposenta pelo regime geral da previdência, permanece a regra de cobrança apenas para os inativos que recebem acima de R$ 5.800,00”.

APE também critica metodologia de desconto nos salários

Já para Flávio Gomes de Barros, presidente da Associação dos Procuradores do Estado (APE), tanto a reforma geral da previdência, quanto a reforma que foi feita pelo governo estadual teve pouca participação da sociedade. A reforma enviada pelo governo Renan Filho (MDB), foi enviada à toque de caixa para a Assembleia Legislativa do Estado (ALE) pelo governador. “Um projeto semelhante havia sido enviado pelo governador para a procuradoria do Estado e desta vez, nem isso foi feito”, complementa.

Segundo o procurador, o formato como foi encaminhado e aprovado este projeto de lei de reforma da previdência estadual pode e será questionado. “Um conjunto de entidades da sociedade civil e também da área do direito irão questionar a legalidade deste processo a partir de janeiro de 2020”.

DESCONTO MAIOR

Uma questão polêmica presente na reforma da previdência estadual e que se desdobra para as reformas da previdência nos municípios é a cobrança dos servidores inativos. “É um absurdo. Para se ter uma ideia do impacto dessa medida, 82% dos servidores estaduais recebem na faixa de R$ 2.200,00 e terão um desconto de R$ 144,00”.

Quanto à reforma que será implementada pelos municípios alagoanos, o procurador Flávio Gomes de Barros é enfático em dizer que “é um injustiça com o servidor inativo que recebe pouco mais de um salário ter um desconto desses nos seus proventos. Esse dinheiro deixa de ajudar na compra de um medicamento ou de um alimento mais adequado. Faz com que menos dinheiro esteja circulando ali, no município e na região e volte para os cofres públicos.”

De acordo com o presidente da Associação dos Procuradores do Estado, foi emitida uma nota dos procuradores tratando, especificamente, de vícios no projeto de lei complementar enviado pelo governo para reestruturar a previdência estadual. Mesmo com o apontamento legal da APE, os deputados estaduais aprovaram a reforma em meio aos protestos de servidores estaduais.

Após a votação, sindicatos informaram que irão se organizar para recorrer do projeto de reforma da Previdência.

Campestre já aprovou a reestruturação

De acordo com a Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), que tem como presidente o prefeito Hugo Wanderley, as prefeituras vêm sendo orientadas e capacitas para adequar-se às novas regras de previdência social, principalmente, o sistema de Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Em Alagoas, apenas Campestre já aprovou as mudanças ainda em 2019. Segundo informações já divulgadas pelo Instituto de Previdência de Maceió (Iprev), “o Município é obrigado a reajustar a contribuição antes da tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 133, a chamada PEC paralela, que deverá alterar a idade mínima para aposentadoria nos estados e municípios”.

Segundo Fabiana Toledo, presidente do Iprev, “o prefeito Rui Palmeira já sinalizou que só vai fazer o que é obrigação neste momento, ou seja, o envio de um Projeto de Lei (PL) à Câmara de Vereadores, propondo o aumento da alíquota de contribuição para 14% sobre os salários de servidores, aposentados e pensionistas acima do teto”.

Mesmo com o aumento da alíquota, as prefeituras irão assumir a responsabilidade pelo pagamento de diversos auxílios, antes cobertos pelo regime próprio. Os auxílio-doença, auxílio-reclusão, auxílio-maternidade, e o salário família agora passarão a ser de responsabilidade das prefeituras e isso exigirá mudanças na Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA).

PLC DE CAMPESTRE

Para o advogado Jorival França de Oliveira Junior, assessor técnico que vem acompanhando junto com a AMA e a Associação dos Procuradores do Estado (APE) as mudanças nos RPPS municipais, na verdade os municípios irão alterar apenas o que se tornou obrigatório pela emenda constitucional 103, que foi promulgada em 12 de novembro de 2019.

“A reforma completa mesmo só ocorrerá após a conclusão da PEC paralela. As regras da Emenda Constitucional 103, que estão no Art. 9° são auto aplicáveis independentemente dos municípios queriam ou não, por serem normas constitucionais”.

Ainda segundo Jorival França, “as principais alterações estão nos parágrafos 2° e 3° que determina que os RPPSs apenas podem custear aposentadorias e pensões. E os benefícios temporários (auxilio- doença, salário maternidade, salário família e auxílio reclusão) passarão a ser custeados pelo tesouro municipal. E o parágrafo 4° que determina que a alíquota dos servidores municipais não poderá ser inferior á dos servidores da União, que no Art. 11 foi estabelecida em 14%.”

AUDIÊNCIAS

Mais de 9.000 pessoas participaram de audiências públicas promovidas pela Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar em Alagoas – Fetag/AL. A federação realizou audiências publicas em 65 municípios alagoanos, para debater as mudanças na previdência social no ano de 2018/2019.

Rilda Alves, secretária de Políticas Sociais da Fetag, destaca que os problemas municipais podem ser amenizados graças ao conhecimento via audiências.

“A nossa avaliação é que essas audiências nos ajudaram a amenizar os danos da Reforma da Previdência para nós rurais, pois nos permitiram a dialogar direto com a base dos deputados federais e senadores”.

Segundo a secretária, “este foi o momento de também dialogar com os prefeitos, vereadores, comércio local e alguns líderes religiosos, colocando pra cada um o prejuízo da reforma para a vida dos municípios pequenos, que sobrevive com a renda das aposentadorias, para movimentar o comércio local. Dessa forma ganhamos apoio de todos no debate dos rurais”, enfatiza a dirigente sindical.

Fonte: Tribuna Independente / Texto: Jairo Silva – Colaborador