“O que estamos observando é a maior violação dos direitos humanos já vista na cidade de Maceió, pois essas comunidades remanescentes estão sendo expostas a condições indignas, que ferem os princípios constitucionais que visam proteger o cidadão”. É desta forma que a líder comunitária Neirevane Nunes classifica a situação enfrentada pela comunidade do Flexal, em Maceió. Cerca de 800 famílias aguardam definição após ficarem “ilhadas” socialmente com a realocação dos bairros vizinhos.

Nem mesmo os laudos apresentados em junho aos órgãos responsáveis pela condução do caso conseguiram por fim ao impasse envolvendo a comunidade que fica situada no bairro de Bebedouro, um dos cincos afetados pelo afundamento de solo. As residências seguem isoladas da rotina urbana da cidade e não há consenso entre os órgãos envolvidos sobre o futuro da região.

“As comunidades remanescentes nestes bairros sofrem continuamente pelos danos causados pela mineradora, estando hoje em situação de total vulnerabilidade, com o empobrecimento das famílias que perderam trabalho, renda e seus negócios. Como também, com a insegurança e com a remoção feita de todos os serviços básicos essenciais devido à situação de risco. Além disso, o próprio ambiente onde estas famílias estão inseridas se tornou insalubre, comprometendo a saúde física e mental das mesmas”, pontua Neirevane.

Órgãos públicos

O líder comunitário e morador do Flexal, Maurício Sarmento, critica a falta de respostas dos órgãos públicos. A expectativa segundo ele é de que novos estudos possam comprovar a relação com o fenômeno e a comunidade, entretanto, não há indicativo se de fato vão ocorrer novas avaliações.

“Aguardaremos os desdobramentos do ofício enviado a CPRM que solicitou perícia in loco além do estudo técnico não realizado nos Flexais. Além disso, tivemos a informação de que a CPRM enviou e-mail para o MPF afirmando ter dúvidas em relação a citação dos Flexais pelo fato de estarem em uma área dentro da margem de erro dos equipamentos utilizados para essa aferição”, pontua.

De acordo com a Força Tarefa do Caso Pinheiro e Adjacências, coordenada pelo Ministério Público Federal (MPF) as tratativas seguem e assim que houver definição o órgão emitirá um posicionamento.

Na semana passada a Defensoria Pública do Estado (DPE) se posicionou favorável a realização de novos estudos na região e solicitou ao CPRM que se manifestasse sobre o assunto. Procurada pela reportagem, a DPE informou que não houve retorno da solicitação.

A Defesa Civil de Maceió, responsável pelo monitoramento da região foi procurada pela reportagem para comentar o caso, mas até o fechamento desta edição não obtivemos retorno.

O Serviço Geológico do Brasil também foi procurado por meio de assessoria de comunicação, entretanto. não retornou os contatos.

Com realocação, comunidades ficaram isoladas

A situação vem se arrastando desde o início de 2020 data que foi firmado o acordo de realocação dos cincos bairros que sofrem com a subsidência causada pela mineração da Braskem.

Com a realocação gradativa dos imóveis ao redor dos Flexais, a comunidade passou a ficar isolada. Além disso, imóveis da região vem apresentando trincas, fissuras e rachaduras. O impacto socioeconômico já foi reconhecido pelos órgãos envolvidos, entretanto, pela falta de comprovação de relação com o fenômeno geológico, eles permanecem no local.
Em abril, as lideranças da região apresentaram à comunidade estudos independentes que relacionam os problemas estruturais das moradias ao afundamento de solo. Os documentos foram protocolados no mês passado aos órgãos responsáveis. Esta semana, Defesas Civis Nacional, Municipal e Serviço Geológico do Brasil (CPRM) assinaram nota técnica conjunta negando a relação com o fenômeno. O posicionamento dos órgãos veio após o pedido do Ministério Público Federal (MPF) para avaliar os estudos realizados.
“As etapas de monitoramento de campo continuam sendo ferramentas de suma importância para o acompanhamento da área em questão, onde a caracterização e interpretação dos danos no local não mostram evidências que possam estar associados ao fenômeno que atingiu outros bairros afetados pelo processo de mineração (…) ”, disse a nota técnica conjunta.

Entendimento

Conforme explicou o MPF, os órgãos chegaram ao entendimento durante reuniões que os estudos apresentados pela comunidade não são suficientes para determinar as causas dos problemas enfrentados.

“Apesar de relacionar as questões prediais e estruturais ao solo, os estudos elaborados não aprofundam ao ponto de relacionar com o fenômeno da subsidência causada pela exploração de sal-gema. Sobre o laudo de engenharia foi dito que o estudo analisou patologias e atrelou a recalques diferenciais, mas não discutiu quaisquer outros motivos que podem levar uma edificação a ter recalque diferencial, assim como questões relativas a execução da obra também, interações com a fundação e com outras estruturas, o tipo de fundação, de solo, nada disso é abordado. Que encontrou as patologias e deduziu que o recalque foi pela subsidência, sem acessar nenhum dado interferométrico”, afirmou o MPF.

TRIBUNA HOJE

Foto: Edilson Omena