O reaparecimento do sururu na Lagoa Mundaú, há cerca de duas semanas, encheu de esperança a população da orla lagunar. Muitos tiram o sustento do marisco e vêm sofrendo há 11 meses com o sumiço. O volume que tem agora, no entanto, ainda é muito pouco. Na análise de quem entende do assunto, ainda não há motivo para comemorar.

O professor e pesquisador Emerson Soares, pós-doutor em ciências aquáticas com ênfase em ecotoxicologia, traz uma preocupação. “O sururu nativo, ele em algum momento ia retornar, porque ali é o habitat dele natural. Só que ele não voltou com a força que deveria voltar, ou seja, retornou por uma pequena melhora nas condições do ambiente, com o aumento da salinidade da água, com uma certa função meteorológica adequada. Em alguns pontos ele desenvolveu. Não é motivo para comemorar nada, a situação é crítica do sururu”.

“A gente tem que dizer, é uma alegria temporária. Com toda a experiência que eu tenho de 25 anos trabalhando com ciências aquáticas, com o conhecimento que eu tenho”, acredita o pesquisador. Mas ele faz uma ressalva: “É óbvio que eu não posso prever o que vai acontecer com sururu nativo, porque como é que vai ser a adaptação dele, acho que a condição vai depender muito do que vai acontecer nos próximos meses”.

Soares lembra que já aconteceu em outras oportunidades do sururu sumir, mas que esse é o momento mais complicado para o molusco. “Ele passou quase 11 meses sumido. Por que isso aconteceu? Porque as condições do ambiente não são adequadas. Em termos de aumento de poluição, qualidade do ambiente não está boa, a lagoa está com muito acúmulo de nutriente poluente. O ambiente está mais raso, com muito sedimento”.

Outro problema que pode estar atrapalhando o desenvolvimento do nativo é o sururu branco. “Tem uma problemática mais agora que é a espécie exótica que é o sururu branco competindo por espaço, por alimento principalmente e o solo. Ele já ocupa dois terços da área do ambiente da Lagoa”.

Ele reforça que é uma aparição relativa. “Esse sururu que está sendo encontrado na Lagoa nativo está muito magro, inclusive muito pequeno ainda”. E defende que é preciso um trabalho de recuperação.

“Deveria se trabalhar o ordenamento manejo do sururu nativo para poder a gente começar a pensar em recuperação dos estoques. Mas enquanto isso apareceu só o pessoal, foi lá e capturou tudo e já está dizimando de novo a população. Como ela vai se recuperar dessa forma?”.

A sugestão do pós-doutor para solucionar o caso seria um trabalho do poder público. “O governo federal, agora com ministério da pesca, o governo estadual e as prefeituras, principalmente de Maceió e as que compõem o complexo lagunar, Coqueiro Seco Santa Luzia [do Norte], Pilar, Marechal [Deodoro], tem que haver um trabalho conjunto essas três esferas das unidades da federação para fazer realmente um trabalho de tratamento e saneamento básico com a BRK, fazer trabalho de reflorestamento educação ambiental e planejamento urbano para começar a mitigar e diminuir os problemas do complexo lagunar”.

População da região da orla lagunar depende do molusco para viver

Em uma banca montada no Dick Estrada, um grupo trabalhava com a produção cozinhando e despenicando sururu ontem (9). Com apenas duas semanas da volta do produto, eles relataram que estavam comercializando o que vem do município de roteiro. “Esse aqui é de Roteiro”, disse Alemão apontando para o maior volume. “O daqui é só esse ali, só tem um pouquinho, não dá conta. Só foi uma parte que nasceu, mas não voltou mesmo. Sururu branco tá topado. A gente só sobrevive com o que vem de Roteiro”, aponta para um tabuleiro ao lado com um volume bem menor.

Alemão é um jovem que há pelo menos 15 anos trabalha com sururu e lembra que em outras chuvas já aconteceu o desaparecimento, mas foi diferente. “Às vezes chovia, dava aquela enchente, mas três meses depois voltava a nascer. Agora passou um ano e nada”.

Dentro da lagoa, alguns catadores falam com mais otimismo. Carlos Roberto conta que sustentava a família com o trabalho na lagoa, e que o período mais difícil está passando. “A gente vai tirando e ele vai se alastrando mais, crescendo mais. Ainda têm alguns brancos, mas dá pra trabalhar devagarzinho. Daqui a meses vai ter bem mais, tenho fé em Deus. Água doce não entrou no rio, e não choveu muito mais”.

Conforme relatam, antes da escassez eles conseguiam vender o quilo por R$ 15. Agora com o custo da produção mais alto está chegando ao valor de R$ 35. Nesse último ano, se viu a população que trabalhava com sururu migrar para outras ocupações.

“Pessoal que vivia de sururu arrumou emprego, saiu do sururu. Metade das pessoas que trabalhava com sururu não trabalha mais”. Junto com os companheiros, Alemão sugere que a solução seria dragar a lagoa. “Limpava tudo, tirava os brancos todinhos, aí era melhora pra nós, voltava tudo como antigamente quando tinha peixe. Agora não tem dono, tá sumindo”.

O pesquisador Emerson Soares pondera que uma dragagem tem pontos positivos e negativos, mas de qualquer forma seria uma medida paliativa, que em pouco tempo tudo voltaria à mesma situação atual.

“A dragagem, ela pode ser feita, mas de forma limitada. Então você daqui a dois, três anos vai ter que gastar dinheiro novamente para fazer o mesmo processo que está fazendo agora. Pode ser três, quatro, cinco anos, mas você vai gastar novamente o que gastou anteriormente com a dragagem. Então, é recomendada a dragagem desde que você tenha também um planejamento para recuperar o sol e a vegetação e tratamento de resíduos ao longo dos dois rios, que abastecem o complexo lagunar. Se você não fizer isso, vai ter uma resolução de uma situação com um paliativo que é apenas temporário”.

Por Emanuelle Vanderlei com Tribuna Independente

Foto: Edilson Omena