Os transtornos causados pelo trabalho de retirada dos destroços do desabamento do que ainda resta do Hotel Atlântico e que foi ao chão, no domingo passado, continuarão nesta terça-feira, dia 23, conforme informou, na tarde de ontem, o coordenador da Defesa Civil Municipal, Abelardo Nobre.

“O plano de demolição é de responsabilidade da Secretaria Municipal de Infraestrutura. É uma construção bastante antiga, de quatro pavimentos. Precisamos nos garantir de todas as questões técnicas para que a demolição ocorra de forma segura e efetiva para eliminarmos, por completo, os riscos”, assegurou.

O esqueleto da edificação, localizado no trecho que liga à Avenida da Paz à Avenida Deputado Humberto Mendes, beirando o Riacho Salgadinho, no bairro de Jaraguá, impactou, de forma negativa, o trânsito na capital durante todo o dia de ontem, principalmente no primeiro horário.

De acordo com a Defesa Civil, o trabalho seguirá o plano de demolição para que o serviço ocorra dentro das normas técnicas de segurança. O órgão acompanha o local do desabamento desde a tarde do último domingo (21), quando isolou a área. A estrutura de concreto caiu sobre a fiação elétrica e os destroços foram parar na pista. O trânsito foi interditado pelo Departamento Municipal de Transportes e Trânsito. Não houve feridos.

No lugar da imponente fachada, muro pichado. Nos quartos que já hospedaram ilustres personagens, plantas cresceram pela ação do tempo. A situação de abandono ao longo dos anos, escondeu que o antigo hotel já foi símbolo de respeito na orla de Maceió.
O proprietário do prédio, Willy Miranda, informou à reportagem do jornal Tribuna Independente que solicitou, à Prefeitura de Maceió, a demolição da estrutura desde outubro do ano passado.

Segundo ele, deixou a Defesa Civil Municipal e a Secretaria Municipal da Infraestrutura (Seminfra) cientes do risco que a estrutura oferecia à população. “A Secretaria Municipal de Infraestrutura chegou a dizer que ia agendar o procedimento de demolição da estrutura, mas em seguida voltou atrás”, salientou.

De palacete do governador ao 1º hotel litorâneo de Maceió I Foto: Reprodução

Willy Miranda salientou que a Seminfra ligou, posteriormente, alegando que não podia demolir porque o prédio é uma propriedade particular. Questionei a posição da Secretaria, chamei atenção para o fato de o local oferecia risco. Esperaram cair para poder vir”.

Por outro sua vez, a Defesa Civil disse que os responsáveis pelo prédio foram notificados para fazer a demolição da estrutura ainda em 2018. “Os proprietários foram notificados da necessidade de demolição ou recuperação da infraestrutura da edificação”, pontuou o órgão ao completar que monitorou o local em 2022 e em 2023.

Devido à interdição, três painéis móveis do Departamento Municipal de Transportes e Trânsito (DMTT) foram deslocados para o local com o intuito de informar os condutores que transitam pela região.

Família Miranda faz apelo por desapropriação do terreno do hotel

Bastante emocionado, Sérgio Miranda, neto de Manoel Simplício Miranda, que comprou o prédio do Hotel Atlântico, na década de 1950, e filho de Manoelito Miranda, conversou, com exclusividade com a equipe do jornal Tribuna Independente. Ele disse que desmoronou junto ao hotel, ao relembrar, com saudosismo, que o antigo Hotel Atlântico hospedou pessoas ilustres como Luiz Gonzaga, Roberto Carlos e Martinho da Vila.

Sérgio Miranda lembra que hotel hospedou figuras ilustres como Luiz Gonzaga e Roberto Carlos I Foto: Edilson Omena

“O Hotel Atlântico tem uma linda história, uma história de luta. Ali, o ex-governador Divaldo Suruagy tomou importantes decisões. Carlito Lima era um frequentador contumaz”, recordou, citando o escritor alagoano.

Sérgio Miranda salientou que a família sabia que o hotel poderia cair a qualquer momento. Tanto que procurou a Prefeitura. Segundo ele, a burocracia emperrou alguma tomada de decisão e a ação do tempo chegou primeiro.

“Tentamos fazer um acordo de desapropriação. Aquele terreno ali deve servir ao governo do Estado, à prefeitura de Maceió. Sabemos que podem construir algo grandioso como fizeram com o Marcos dos Corais. A família sonha com um memorial ao meu avó Manoel Simplício de Miranda. O Hotel Atlântico era o quartel general da família Miranda que sofreu ali com a perseguição, com a repressão política. Tivemos políticos como Nilson Miranda e Jaime Miranda”, frisou, referindo-se aos irmãos.

Sr. Manoel Simplicio Miranda, patriarca da família Miranda, pai de Jaime Miranda e avô de Sérgio Miranda

Nilson Miranda, quando vereador por Maceió, teve um mandato relâmpago. Eleito em 1962, empossado em janeiro de 1963, teve seu mandato cassado pela Câmara Municipal, no dia 3 de abril de 1964. Posteriormente, teve seus direitos políticos suspensos por 10 anos.

Jaime Miranda, jornalista, advogado e deputado estadual, desaparecido político desde 1975, é considerado um mártir da luta contra a ditadura.

“Em nome de toda essa história, a família apela para que a prefeitura derrube toda a estrutura do hotel, deixe apenas o terreno e faça a desapropriação. O sangue dos Miranda está encravado ali”, finalizou. A história dos Miranda continua no Estado. Sérgio Miranda é vice-presidente do Sindicato dos Gráficos de Alagoas.

Jornalista conta que prédio já serviu de palacete de governador

O jornalista e historiador Edberto Ticianeli escreveu, em seu site História de Alagoas, que o Hotel Atlântico foi o primeiro hotel litorâneo de Maceió e já serviu de palacete do governador.

“Mas antes de vivenciar os tempos de glória e ser ponto de referência aos turistas que desembarcavam no litoral do Estado, o prédio serviu como Quartel General da Inspeção Permanente do Exército, em de outubro de 1910, quando era ocupado pelo general de divisão Francisco da Rocha Callado, nascido em Alagoas”, diz um dos trechos extraídos do site.

Anos depois, recordou o jornalista, a chave do imóvel foi vendida ao doutor Levino David Madeira, que era casado com Rosa de Lyra Madeira – filha do coronel Carlos Lira –, à época, proprietário do jornal Diário de Pernambuco. Inclusive, no portão de ferro da entrada constava as iniciais L e M, clara referência a Levino Madeira.

Na década seguinte, o governo do Estado, contou Edberto Ticianeli, aproveitou as instalações do imóvel, que passou a funcionar como uma Casa de Veraneio dos governadores.

“Mas pouco tempo durou até o palacete voltar às mãos dos antigos proprietários, quando ficou por anos fechado”.

“E a reabertura aconteceu em grande estilo: o antigo casarão deu lugar ao Hotel Atlântico, o primeiro da história de Maceió na faixa litorânea da cidade. As instalações eram exploradas por Adib Rabay, o mesmo proprietário do Hotel Aurora e Bella Vista Palace Hotel. Este último foi considerado como um dos mais bonitos do Brasil pelo embaixador português e dramaturgo Júlio Dantas, quando ficou hospedado por lá no ano de 1924”, lembrou.

No ano de 1951, o Hotel Atlântico foi comprado por Manoel Miranda e permaneceu sob posse da família até o final dos anos 80, quando os anos de glória acabaram e ele deixou de funcionar. Uma das alas, inclusive, chegou a ser demolida após determinação da Prefeitura de Maceió para concluir a construção da Avenida Humberto Mendes.

Durante anos, o Hotel Atlântico foi referência para turistas que visitavam Maceió, sendo o primeiro localizado na área litorânea da capital alagoana.

CADA MINUTO

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